quinta-feira, 8 de abril de 2010

The Soaked Lamb: Blues domingueiro

Entrevista para O Lado P: Em 2006 os Soaked Lamb fintaram a ordem natural das coisas. Gravaram “Homemade Blues” na socapa dos domingos e só depois se assumiram enquanto banda para partirem para a estrada. Agora “Hats & Chairs” chega às lojas com toda a lentidão do mundo. Porque a pressa é inimiga da perfeição e porque a música (a deles) só poderia ser feita assim. Devagar. Como quem não quer a coisa.

O disco de estreia “Homemade Blues” situou os Soaked Lamb algures entre a sonoridade da cultura norte americana dos anos 30. Como lidaram com essa colagem imediata ao imaginário dos blues do início do século XX?

Os Soaked Lamb revêem-se nos blues mais rurais e primitivos sem no entanto ser um processo muito planeado. Os Soaked Lamb surgiram um pouco ao contrário do que é normal. Gravámos o disco e só depois nos assumimos como banda. Todo o som que foi criado não foi muito pensado. Assim, a banda resulta numa reunião de gostos pessoais e da música que os seus elementos ouvem em casa.

O jazz e os blues dessa altura nunca foram muito explorados por bandas portuguesas. Quiseram aproveitar essa lacuna de modo a exprimirem os vossos gostos pessoais?

Não quisemos explorar nenhum filão. A nossa intenção é fazer o que gostamos. Muitas pessoas tentam descobrir algo que venda e não temos nada contra. Adorávamos que as pessoas gostassem do que nós fazemos e em vez de vendermos 500 discos vendêssemos 5 mil. Mas não fazemos nada para atingir essa meta nem tentámos encontrar um cantinho da música que não tivesse sido explorada.

Os Soaked Lamb dizem fazer as músicas como eram feitas “há 70, 80 anos atrás com o cuidado de quem faz uma melodia para durar e não um ritmo para trepar topes”. Apesar das boas críticas, o sucesso comercial é mesmo secundário?

É completamente secundário! Nós não somos músicos profissionais. Fazemos música porque gostamos e temos as nossas profissões que nos pagam a renda da casa. Se fosse possível tornarmo-nos músicos profissionais, teríamos essa preocupação. Neste contexto fazemos o que queremos sem nenhuma pressão nem preocupação comercial.

“Hats & Chairs” é um disco menos artesanal. O que mudou em relação ao primeiro disco?

O “Homemade Blues” nasceu de uma ideia sem haver uma banda. “Hats & Chairs” é um disco que já tem uma banda ensaiada e com mais experiência que tinha tocado ao vivo um pouco por todo o país. Por isso este disco foi pensado ao longo desse tempo enquanto banda e o outro não. Uma outra diferença que acaba por ter uma grande influência no resultado final foi o facto de “Homemade Blues” ter sido gravado em casa e “Hats & Chairs” ter sido gravado em estúdio. Apesar disso, à semelhança do primeiro disco, este também durou cerca de um ano a gravar.

Os vossos processos de gravação são algo longos. Os Soaked Lamb são demasiado perfeccionistas ou trata-se apenas do vosso ritmo natural de trabalho?

Não somos nada perfeccionistas! Mas existe sempre algum cuidado e atenção em determinados detalhes relacionados com alguns instrumentos ou até com a imagem da própria banda. A duração do processo de gravação tem a ver com o facto de a música não ser a nossa profissão. É verdade que podíamos ter tirado férias e fecharmo-nos num estúdio para gravar o disco de uma ponta à outra. Não o fizemos e por isso a nossa obra continua a ser um pouco caseira nesse sentido.

Ainda assim houve oportunidade para “recrutar” o Branko Neskov para a mistura e masterização do disco...

O Branko Neskov é uma pessoa muito experiente na sonorização de longas metragens. O Miguel Lima [baterista] já tinha trabalhado com ele há algum tempo. Durante as gravações de “Hats & Chairs” ele propôs-lhe fazer a mistura do disco. Deu-lhe uma música e o Branko ficou muito entusiasmado e partiu para o disco com toda a vontade, apesar de ter havido alguma relutância inicial.

Os Soaked Lamb sentem-se de alguma forma atraídos pelo espectro cinematográfico? Como surgiu a oportunidade de integrarem o filme “A Arte de Roubar” de Leonel Vieira?

Foi novamente através do Miguel Lima. Ele foi o responsável pela sonorização e montagem do som do filme. Durante o processo ele sugeriu ao Leonel algumas bandas que tivessem um som que jogasse bem com o espírito do filme. Entre as sugestões estavam os Soaked Lamb. Só na altura de sonorizar o filme é que ele conheceu realmente o disco e gostou muito da forma como os temas entraram no filme. Não foi aquela ideia romântica do convite do realizador mas o resultado final funcionou muito bem.

www.soakedlamb.com

Hugo Amaral / o lado p

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